DESDE HÁ muitos anos, em especial desde o governo de Durão
Barroso, que a política portuguesa relativamente à Guiné-Bissau tem sido
marcada por factores que objectivamente a condicionam e que têm colocado outros
interesses, que não os do Estado português, à frente do que devia determinar
essa mesma política.
Perdoe-se-me a imodéstia, mas sei do
que falo. E há que chamar os bois pelos nomes. Há que dizer, preto no branco,
que em grande parte das decisões tomadas em Lisboa sobre a sua antiga colónia
pesam mais factores de interesse pessoal de quem tem tido capacidade de
influenciar os responsáveis políticos que qualquer outra coisa. Eu nestes anos
já vi um pouco de tudo: desde altos quadros da Galp serem sócios de um
antigo primeiro-ministro daquele país até a um negligente conselheiro da nossa
embaixada em Bissau preocupar-se única e exclusivamente com os seus negócios
particulares de exportação de caju em constante detrimento de dossiers
sensíveis e de inegável importância, passando pela verdadeira inoperância por
parte de quem devia possuir a obrigação de, no terreno, recolher as informações
essenciais para os decisores políticos. Como também já vi embaixadores
portugueses acreditados em Bissau (há excepções, honra lhes seja feita!) que
encaravam e exerciam o posto como se de um "frete" se tratasse ou
chefes da diplomacia portuguesa sempre lestos a seguirem caninamente as
directivas vindas da capital angolana.
Sejamos claros: hoje a Guiné-Bissau
pode viver na iminência de mais um golpe de estado. Só não o vê quem não quer.
O que se tem passado nas últimas semanas, com um ministro espancado à
porta de casa em circunstâncias que muitos atribuem a uma crescente tensão
entre governo e militares; com outro que foi protagonista de um episódio
mal-contado e cujo afastamento terá de ter obrigatoriamente a
"benção" do poderoso general António Indjaí; e com ainda
outros episódios graves que não vieram a público mas que mostram bem como hoje
os militares olham com desconfiança os civis que ocupam o poder em Bissau, é
preocupante e devia levar Lisboa a repensar a sua posição autista e pouco
consentânea com o que deviam ser os interesses do Estado português, hoje
tão à mercê dos jim thompson's da vida e das suas negociatas.
Oxalá me engane e este meu prognóstico não passe de um mero desabafo
pessimista... Mas se por azar, este actual governo guineense (que integra os
principais partidos, incluindo o PAIGC do primeiro-ministro deposto, é preciso
que se note…) vier a ser derrubado, então sim acreditem que qualquer presença
ou influência portuguesa naquele país pura e simplesmente desaparece. E não
venham então dizer que a culpa é do general "X", do brigadeiro
"Y" ou do coronel "nãoseiquê", para
quem Portugal nada significa e para quem infelizmente hoje apenas identificam
como quem fechou os olhos, virou as costas, pactou ou mesmo estimulou ao
longo dos últimos dez anos a degradação do estado de coisas na Guiné-Bissau. Ou
seja quem contribuiu objectivamente para facilitar a chegada e a manutenção no
poder de quem dele se serviu para destruir uma nação e apropriar-se das suas
riquezas, em nome de uma democracia que nunca existiu e de um estado de direito
que se baseava na roubalheira mais descarada. A culpa, essa, isso sim, será,
entre outros, de um Durão Barroso, de um Paulo Portas, de um
Passos Coelho e até de um Cavaco Silva. Só não será de um Rui
Machete porque esse, coitado, é praticamente inimputável!
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